De acordo com a professora Ana Paula Fracalanza, o direito à água é uma base para todos os outros direitos humanos, sendo possível dizer que a sua falta é um risco para a sua segurança
É fundamental uma maior distribuição de água para a população que não tem acesso à água em quantidade e qualidade adequadas – Foto: Marcos Santos
Uma pesquisa realizada pelo World Resources Institute (WRI) relatou que, caso alguns países não apresentem alterações significativas em seus hábitos de consumo de recursos primários, é provável que cerca de um bilhão de pessoas se encontre em situação de escassez hídrica até 2050. De acordo com o relatório, os países que mais sofrem com a falta de água atualmente são Bahrein, Chipre, Kuwait, Líbano e Omã. O Brasil se encontra entre os Estados que apresentam risco baixo ou médio, sendo necessário que ações governamentais passem a ser tomadas para garantir a segurança desse recurso no País.
Ana Paula Fracalanza, professora da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) e pesquisadora do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da Universidade de São Paulo, explica que o déficit hídrico em uma localidade está associado ao uso da água em função de sua disponibilidade tanto em quantidade quanto em qualidade adequadas. “Esse fator está também relacionado ao contingente populacional nessa região, então é uma questão relativa”, explica.
Escassez e desdobramentos
A professora reflete ainda que um aspecto importante para a avaliação desse debate é a poluição dos recursos hídricos, uma vez que, quanto mais poluídos, maior é a sua escassez. Atualmente, a posição brasileira nesse cenário depende da região que será considerada, por isso, a pesquisadora analisa que, apesar da frequência com que se fala sobre a posição privilegiada do País nessa discussão, existem localidades em que há escassez em qualidade — com a falta do recurso de forma tratada — e em quantidade.
A região metropolitana de São Paulo, por exemplo, que conta com um grande contingente populacional e com rios poluídos que não podem ser utilizados para abastecimento, apresenta uma escassez que pode ser visualizada com maior facilidade. “Mesmo quando se considera a região do rio Amazonas e a região Norte do País, existem localidades em que essa quantidade de água para abastecimento é poluída, até em razão de questões como a população não ter esgotamento sanitário adequado”, adiciona Ana Paula.
Ana Paula Fracalanza – Foto: Marcos Santos/USP Imagens
Para além dessas questões, a crise hídrica apresenta também efeitos ambientais, já que a prioridade da água torna-se o abastecimento humano, diminuindo o volume de água nos reservatórios e prejudicando os ecossistemas. A especialista complementa ainda que essa temática passa por questões sociais, uma vez que a população socioambientalmente vulnerabilizada acaba tendo maior dificuldade de acesso à água nessas situações.
Direito humano
Desde 2010, a Organização Mundial da Saúde (ONU) declara o acesso à água potável e ao saneamento básico como um direito essencial, fundamental e universal para a vida. “Dessa forma, ele é uma base para todos os outros direitos humanos, sendo possível dizer que a sua falta é um risco para a segurança destes”, afirma a especialista.
O déficit hídrico em uma localidade está associado ao uso da água em função de sua disponibilidade – Foto: freepik
Dessa forma, destaca-se o fato de que o papel dos Estados nacionais poderia estar mais relacionado à regulação do uso da água e ao seu uso equitativo pela população, sendo necessário também que os setores agrícola e industrial se envolvam nesse processo. “É importante incentivar o reúso da água para que não se use a água tratada e potável, por exemplo, para o esgotamento sanitário”, adiciona.
Por fim, Ana Paula destaca que a participação populacional é relevante para a gestão desses recursos escassos, assim, é importante que o Estado seja transparente na divulgação de informações sobre a qualidade da água, sobre sua posição em relação à atual crise. “É fundamental uma maior distribuição de água para a população que não tem acesso a água em quantidade e qualidade adequadas, ou seja, para a população socioambientalmente vulnerabilizada”, finaliza.
*Sob supervisão de Paulo Capuzzo
Fonte: Jornal da USP/ Radio USP