Onde está aquele copinho de plástico que você usou para beber água no ano passado? E o papel da bala que chupou há cinco anos? Pesquisas recentes têm destacado a necessidade de entender melhor os efeitos dos fragmentos desses recipientes sintéticos nos animais e ecossistemas de água doce. Embora a mortalidade observada nos testes tenha sido baixa, a exposição no longo prazo pode ter efeitos prejudiciais na saúde dos organismos – e quanto menores os fragmentos, maior o potencial de danos. Os efeitos cumulativos podem ser preocupantes até para os humanos, mas como não há legislação a respeito, também não existe ainda um monitoramento das possíveis consequências.
São considerados microplásticos as unidades com menos de cinco milímetros de diâmetro. Essas partículas são encontradas desde as profundezas do oceano até em lagos e rios. Cada tipo de plástico possui uma composição específica que pode causar danos diferentes no organismo. Pesquisas recentemente publicadas pelo Laboratório de Limnologia do Departamento de Ecologia do Instituto de Biociências (IB) da USP trazem diferentes abordagens no trabalho com estes fragmentos.
Hyalella azteca – Foto: Scott Bauer/Wikimedia Commons
Visualização de partículas de microplástico usando microscopia de fluorescência invertida – Foto: artigo na revista Ecotoxicology
Amostra da ingestão de microplásticos de polipropileno envelhecidos naturalmente por Chironomus sancticaroli durante o período de exposição (144 h) em três concentrações diferentes – Foto: artigo na revista Ecotoxicology
Lucas Gonçalves Queiroz – Foto: Arquivo pessoal
Sobre a reciclagem, Bárbara Rani-Borges, que também compõe o time de cientistas do laboratório, acrescenta: “Durante o processo de reciclagem também há produção de CO2 [gás carbônico] e o material também vai se quebrar e gerar microplástico. A reciclagem é muito importante para gestão dos resíduos sólidos, mas para a problemática do microplástico não fará tanta diferença”.
A pesquisadora, que trabalhou com bactérias e fungos capazes de fazer a biodegradação de plásticos, destaca que mesmo essas iniciativas não são a solução para o problema do microplástico no ambiente. “[Os microrganismos] precisam de uma condição ideal de luminosidade, de temperatura, de pH [de acidez] e de uma série de fatores que no ambiente dificilmente serão encontrados. Não é a solução também porque a conta não fecha. A quantidade de plástico que é produzido anualmente é muito grande e a eficiência desses organismos que podem induzir a biodegradação é muito baixa. Não tem como isso ser feito em escala industrial.”
Além dos efeitos diretos, o plástico também pode servir como transportador de outros contaminantes impregnados em ranhuras e poros, como pesticidas e drogas. Da mesma maneira, alguns fungos e bactérias que causam doenças podem colonizar a sua superfície. “É o que alguns trabalhos chamam de plastisfera, um microecossistema.”
Fungo Aspergillus tubingensis. Plastisfera: colônias em plásticos minúsculos podem ser inimigos da vida aquática – Foto: Qing-Wei Tan, Fang-Luan Gao, Fu-Rong Wang, and Qi-Jian Chen/NIH
Bárbara Rani-Borges – Foto: Arquivo pessoal
Quando um poluente entra no organismo, a tendência é que se formem espécies reativas de oxigênio, que são tóxicas. Enzimas antioxidantes são responsáveis por eliminar esses compostos químicos – e o organismo entra em um estresse oxidativo quando tenta combater esses contaminantes e precisa produzir mais enzimas do que o normal. Por meio do aumento ou da redução da atividade dessas enzimas, é possível saber o nível de exposição a partículas nocivas.
Há também outras medidas importantes. “Nós quantificamos as partículas que foram ingeridas. Alguns dos nossos estudos avaliam também a taxa de partículas que saem, porque pode acontecer de algumas ficarem presas no corpo. Dependendo de quanto tempo essa partícula ficar retida, podemos considerar como uma bioacumulação, mas precisaria de um estudo específico para isso”, define Bárbara Borges.
Um cubo de 3 centímetros de cada lado teria uma área superficial total de 54 centímetros quadrados. Para calcular essa área, somamos as áreas dos seis lados do cubo. Cada lado possui uma área de nove centímetros quadrados (3 vezes 3 centímetros de cada lado). Multiplicando seis por nove temos a área de contato total de 54 centímetros quadrados.
Se a mesma peça fosse fragmentada em cubos de 1 centímetro, seriam 162 centímetros quadrados no total, uma área de contato três vezes maior. Para calcular essa área, somamos as áreas totais de cada lado dos cubos menores — 1 centímetro quadrado. Como são seis lados e 27 cubos menores, temos um total de 162 (6 vezes 27) centímetros quadrados, que corresponde a três vezes a área do cubo maior (3 vezes 54). Se o plástico carregar substâncias nocivas, elas serão mais facilmente liberadas por fragmentos menores.
Quando os pedaços são muito pequenos, na faixa dos nanômetros (0,000001 milímetros), podem ficar acumulados no organismo. “Quanto menor, mais fácil também para essa partícula atravessar as barreiras celulares, chegar a outros órgãos e ficar alojada”, explica a pesquisadora.
O plástico é qualquer material fabricado industrialmente cuja plasticidade permite que seja moldado em várias formas. De acordo com um relatório de 2021 do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), ele soma 85% do lixo encontrado nos oceanos, onde os rios desaguam. Os mais encontrados no ambiente são o plástico PE (polietileno), o plástico PP (polipropileno), o PET (polietileno tereftalato), o isopor (poliestireno) e o PVC (policloreto de vinila). Em conjunto, eles representam cerca de 70% dos plásticos encontrados, mas isso depende da amostra.
Bárbara Borges acrescenta que a lavagem de roupas de material sintético, ainda mais em temperaturas elevadas, libera milhares de fibras de poliéster, que também são microplásticos. Embora não considere uma solução, a cientista enfatiza a importância de uma legislação para o problema. “É importante reciclar o nosso lixo, reduzir a quantidade de plástico que consumimos no nosso dia a dia, prestar mais atenção na quantidade de lixo que produzimos e tentar encontrar uma forma de reduzir essa quantidade, mas nós precisamos de leis mais rígidas”. Lucas Queiroz ressalta que, mesmo que não sejam produzidos mais plásticos a partir de hoje, o problema já se prolongaria por gerações. “O que temos de plástico no ambiente hoje já é suficiente para produzir microplástico por centenas de milhares de anos.”
Mais informações: e-mails barbara.rani-borges@usp.br, com Bárbara Rani-Borges, e queiroz@ib.usp.br, com Lucas Gonçalves Queiroz
Texto: Ivan Conterno
Arte: Joyce Tenório
FONTE: JORNAL DA USP