Falta de modelagem de dispersão de óleo corrobora a negativa do Ibama para a Petrobras

Abertura de poços de exploração na foz do Amazonas pode oferecer riscos ao bioma, diz o professor Ronaldo Francini Filho

Abertura de poços de exploração na foz do Amazonas pode oferecer riscos ao bioma, diz o professor Ronaldo Francini Filho

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“É preciso que o estudo dos impactos ambientais seja independente e não atrelado às empresas” – Foto: Wikimedia Commons-CC

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A negativa do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) ao pedido da Petrobras para  a exploração da foz do Rio Amazonas gerou muita repercussão: membros do próprio governo entraram em desacordo sobre o assunto. “Essa negativa do Ibama vem de um processo bastante tortuoso de tentativas e do próprio órgão solicitando às empresas um aumento no banco de dados da região. Então, a gente precisa de informações básicas para conseguir avaliar o impacto de um empreendimento desse tipo, como: quais são as espécies que ocorrem ali? Quais são os ecossistemas? Qual seria a área de abrangência desse empreendimento com uma modelagem de dispersão de óleo muito bem feita? Mas os estudos que foram apresentados têm lacunas seríssimas em todas essas frentes”, coloca o professor Ronaldo Francini Filho, do Centro de Biologia Marinha (Cebimar) da USP.

A região, como coloca o professor, é de difícil exploração, tendo em vista os riscos biológicos que seriam apresentados com a montagem de poços de petróleo e gás: “Ela tem algumas características que fazem com que a exploração seja particularmente desafiadora e a operação impõe diversos riscos do ponto de vista logístico, ambiental, biológico e também social”.

Problemas

“Por exemplo, o bloco em questão fica a 500 km da foz do Amazonas, mas ele está a menos de 40 km do Grande Sistema Recifal, que só foi caracterizado com mais detalhes recentemente”, explica Francini. O conhecimento a respeito da área, uma região que abarca um recife com algumas espécies que desapareceram de outros lugares do mundo, ainda é baixo, diz o professor. Por isso, deveria haver muito mais cuidado com o manejo e as permissões de exploração: “Eu acompanhei outros pedidos de exploração e, o que a gente tem agora, a Petrobras basicamente ‘reciclou’ um pedido de uma solicitação anterior. Eu realmente tinha expectativa de que a Petrobras tomasse um cuidado maior com relação a alguns pontos muito primários”.

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Ronaldo Francini Filho – Foto: Reprodução/Fapesp

É preciso que o estudo dos impactos ambientais seja independente e não atrelado às empresas, analisa o especialista. “Além da questão da fragilidade ambiental dessa região, a gente tem os maiores manguezais do planeta na costa. Também temos dezenas de reservas extrativistas que são unidades de conservação e a população tradicional depende dos recursos de lá. Tem toda uma conectividade, interdependência, entre esses ambientes”, completa.

Um dos empecilhos citados pelo professor é a falta de clareza da modelagem de dispersão de óleo: “Essa modelagem não consegue nos mostrar de forma confiável aonde o óleo vai chegar. A gente tem que lembrar que são centenas de blocos ali na região, esse é só o primeiro que poderia ser explorado potencialmente. Se a gente não souber aonde o óleo vai chegar, fica muito difícil fazer uma avaliação ambiental adequada. Esse é um ponto crucial”.

Outro ponto é que, mesmo que a instalação fosse feita, o risco de possíveis vazamentos ainda existe. “Tem toda uma complexidade que não está sendo levada em consideração pelo estudo de impacto ambiental e que, em caso de vazamento, complicaria em demasia qualquer tipo de estratégia de mitigação. A própria Petrobras utiliza dispersantes, que são substâncias jogadas na superfície do mar e que fazem com que o óleo vá para o fundo, porém, elas se mostraram extremamente tóxicas. Hoje até existe uma discussão se o óleo não é menos tóxico do que o próprio dispersante”, ressalta Francini.

Possibilidades

“A gente precisa repensar, como sociedade, que ninguém é contra a exploração de petróleo e o uso de óleo, mas a gente precisa ter um processo de licenciamento com decisões baseadas em dados concretos e confiáveis. A gente sabe qual é a sensibilidade ambiental, mas alguns acreditam que a exploração é importante porque, do ponto de vista econômico, vale a pena perder aquele ecossistema por isso. Porém, os riscos reais não foram apresentados para a sociedade”, pontua o especialista. A falta de estudos detalhados e até de uma modelagem completa são pontos fundamentais para a negativa do Ibama.

Francini ainda acrescenta: “Eu acho que esses dados não foram levantados em detalhe porque, provavelmente, eles vão demonstrar a inviabilidade do empreendimento. As empresas evitam coletar dados mais detalhados sobre a região para conseguir viabilizar a exploração de óleo ali por meio desses blocos. Eu acredito que, para a foz do Amazonas, os riscos são grandes demais para que a gente avance na exploração”.

Para saber mais, acesse o parecer técnico do Ibama sobre o assunto: https://www.gov.br/ibama/pt-br/assuntos/noticias/2023/ibama-nega-licenca-de-perfuracao-na-bacia-da-foz-do-amazonas/parecer-coexp-fza-59.pdf .

 

Fonte: Jornal da USP / Rádio USP

 

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