Pesquisadores de laboratório em Ribeirão Preto simplificaram modelo preditivo construído por matemáticos da China
Basta lavar uma camiseta de poliéster para que micropartículas de plástico sejam soltas na rede de esgoto. “Essa água escorre para o rio, que a leva para o mar e para os lençóis freáticos. O planeta está contaminado com partículas de microplástico”, alerta o professor Alexandre Souto Martinez, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP.
Sob o efeito do tempo, peças maiores de plástico também liberam partículas com tamanho entre um micrômetro (um milésimo de milímetro) até mais ou menos 5 milímetros. “Ingerido por animais, isso pode provocar inflamação gastrointestinal, redução na capacidade de alimentação, malformação de fetos, infertilidade, entre outros problemas” informa Lindomar Soares dos Santos, pesquisador do Laboratório de Modelagem em Sistemas Complexos (LMSC) da FFCLRP.
Martinez e Santos simplificaram um celebrado modelo de impacto do microplástico na interação entre animais que foi publicado por pesquisadores da Xi’an Jiaotong-Liverpool University, na China, em 2020. O estudo chinês foi apresentado ao professor pelos alunos do curso de Física Médica do campus de Ribeirão Preto da USP Lucas Murilo da Costa e Mateus Mendonça Ramos Simões. O resultado obtido preserva a capacidade descritiva e preditiva do trabalho dos pesquisadores estrangeiros.
“Eles acharam o assunto interessante e escolheram como tema de seminário, pois este trabalho usava as técnicas que havíamos estudado nas aulas. Durante a apresentação fiquei muito interessado e percebi que poderíamos ir adiante com soluções que passaram despercebidas pelos autores do artigo original. Os alunos toparam trabalhar nisso, mesmo após as aulas terminadas”, relembra Martinez.
O gráfico mostra o crescimento explosivo dos predadores – Foto: Reprodução/Estudo
Preocupação mundial
Segundo o professor Alexander Turra, do Instituto de Oceanografia (IO) da USP, a exposição dos seres humanos aos microplásticos ocorre mais através das partículas que estão no ar, dado que não comemos os aparelhos digestivos da maioria dos animais, onde eles se concentram.
Embora o lixo seja um problema mundial, Turra destaca ao Jornal da USP que atualmente a contaminação causa apenas problemas crônicos e fisiológicos nos animais, e não agudos, que levariam à morte rapidamente. “Esse trabalho simula uma situação hipotética extrema.” De qualquer forma, as partículas, com maior área de contato relativa que os pedaços maiores, carregam substâncias poluentes.
Também consultado pelo Jornal da USP, o professor Marcelo Luiz Martins Pompeo, do Instituto de Biociências (IB) da USP alerta que não há atualmente uma tendência de redução do crescimento do uso de plástico. “O microplástico nada mais é do que o fracionamento contínuo dos plásticos, principalmente por mudanças de temperatura, radiação solar e questões físicas. Quanto menor o tamanho da partícula, maior é a área superficial proporcional que poderá ter outros compostos químicos.”
Ana Lucia Brandimarte, professora do IB, acrescenta que o problema nos afeta tanto na alimentação quanto nos usos econômicos dos recursos naturais. “Com a queda na capacidade reprodutiva, eventualmente espécies acabam sendo extintas localmente.”
Hoje, a única alternativa é a prevenção. “Para minimizar o problema em nível mundial, deveria haver políticas públicas para reduzir a produção de microplásticos”, explica Pompeo. “Tudo que é de uso único deveria ser a princípio vetado: canudinho, luvas usadas nos restaurantes, copos plásticos, saquinhos de supermercado.”
De acordo com Turra, um tratado negociado internacionalmente deve ser finalizado até o final de 2024 para que sejam construídos mecanismos de combate ao problema.
Mais informações: e-mails asmartinez@usp.br, com Alexandre Souto Martinez, e lsoaressantos@gmail.com, com Lindomar Soares dos Santos
Fonte: Jornal da USP