Em todo o mundo, mais de dois bilhões de pessoas carecem de acesso confiável a água limpa. E uma solução para atender a essa necessidade funciona como uma esponja, absorvendo a água limpa e removendo os contaminantes
Pesquisadores da Universidade de Princeton (EUA), desenvolveram a próxima geração de sua tecnologia de gel absorvedor solar, um dispositivo que pode ser a chave para desbloquear o acesso à água limpa para pessoas em todo o mundo. O gel esponjoso é barato, fácil de usar e requer apenas luz solar para filtrar poluentes como metais pesados, óleos, microplásticos e algumas bactérias da água, tornando-o uma alternativa para purificação de água fora da rede.
As pesquisadoras Néhémie Guillomaitre e Xiaohui Xu seguram uma amostra do gel absorvedor solar, que age como uma esponja para absorver a água limpa e filtrar os contaminantes. (Foto de Bumper DeJesus)
O dispositivo demonstra um aumento de quase quatro vezes na taxa de filtração em relação à tecnologia de primeira geração, desenvolvida em 2021. Um metro quadrado do material de um centímetro de espessura pode produzir mais de um galão (3,79 L) de água em apenas 10 minutos e fornecer água limpa suficiente para atender à demanda diária em diversos locais do mundo. Os detalhes do novo gel absorvedor solar foram publicados em 8 de fevereiro, na ACS Central Science.
“Houve muitos esforços para desenvolver uma tecnologia que usa energia solar para criar água limpa e potável, mas muitas vezes eles não conseguem produzir água suficiente para atender às necessidades diárias”, disse Rodney Priestley, reitor da Graduate School, Pomeroy e Betty Perry Smith, professor de Engenharia Química e Biológica e professor associado do Andlinger Center for Energy and the Environment. “Esta última iteração de nossa tecnologia, nos aproxima mais um passo em direção ao objetivo de ter uma tecnologia movida a energia solar que pode realmente produzir água limpa suficiente para atender à demanda diária”.
No centro esponjoso do dispositivo, está um gel formado a partir de um polímero conhecido como poli(N-isopropilacrilamida) ou PNIPAm, que pode absorver ou liberar água, dependendo da temperatura.
Abaixo de 33 graus Celsius, este hidrogel age como uma esponja para absorver a água de uma fonte como um lago. Mas quando o hidrogel é retirado da água e aquecido pela luz solar a uma temperatura acima de 33 graus, ele começa a liberar a água. Com a adição de polímeros como polidopamina (PDA) à superfície do gel, o dispositivo pode filtrar contaminantes como óleos, metais pesados, microplásticos e alguns tipos de bactérias.
Segundo os pesquisadores, o gel é mais barato e simples de usar do que os sistemas existentes, que dependem da evaporação. Os usuários simplesmente lançam o dispositivo semelhante a uma esponja em uma fonte de água até que fique saturado. Em seguida, retiram-no da água, colocam-no ao sol e esperam que libere a água filtrada. Sob o sol do meio-dia, o gel pode liberar cerca de 70% da água que absorve em apenas dez minutos.
“Nosso primeiro gel absorvedor solar já teve um alto desempenho”, disse Xiaohui Xu, pesquisadora da Universidade de Princeton e primeira autora do estudo. “Mas queríamos continuar tornando o dispositivo ainda mais eficiente na filtração de água.”
De acordo com Xu, o aumento dramático na velocidade de filtração decorre das mudanças que os pesquisadores fizeram na estrutura do hidrogel entre a primeira e a segunda geração, que aumentaram sua capacidade de transportar água. Embora a primeira e a segunda geração utilizem o mesmo hidrogel PNIPAm, os pesquisadores descobriram que poderiam alterar o gel para ter uma estrutura fibrosa mais interconectada, sintetizando o polímero em uma mistura de água e etilenoglicol
Xu afirmou, que a abordagem não convencional levou a uma melhoria importante em relação à maioria dos hidrogéis existentes, que tendem a ter uma estrutura semelhante a um favo de mel com paredes que impedem o transporte de água. Ela comparou a estrutura fibrosa e interconectada do novo hidrogel com a de uma bucha madura, que é comumente usada como esponja em banheiros e cozinhas.
O hidrogel é composto por uma estrutura fibrosa (canto superior direito, ampliado) que se assemelha a uma bucha (canto inferior direito). (Imagens de laboratório cortesia dos pesquisadores, imagem de bucha de stock.adobe.com)
lém de sua velocidade de filtração aprimorada, Néhémie Guillomaitre, coautora do estudo e estudante de pós-graduação em engenharia química e biológica, acrescentou que o gel absorvedor solar de segunda geração apresenta outras melhorias em relação ao seu antecessor.
Por exemplo, os pesquisadores deram ao gel absorvedor solar propriedades anti-incrustantes adicionando outro polímero, poli (metacrilato de sulfobetaína) (PSBMA), à superfície do gel. O PSBMA não apenas ajuda o dispositivo a filtrar os contaminantes da água com mais eficiência, como também se liga firmemente às moléculas de água na superfície do gel, para formar uma camada de hidratação que repele o óleo e as bactérias, o que permite que o dispositivo seja autolimpante.
“Ter propriedades anti-incrustantes ajuda o gel a durar mais tempo”, disse Guillomaitre. “Há menos necessidade de se preocupar com óleos e filmes bacterianos se acumulando na superfície do gel com o tempo e diminuindo sua eficiência.”
Os pesquisadores acreditam, que o gel absorvedor solar pode ser dimensionado para se tornar uma opção atraente para a purificação de água em nível doméstico e fornecer acesso a água limpa, sem a necessidade de depender de energia da rede.
“O ideal seria que essa tecnologia pudesse um dia ser usada por qualquer pessoa preocupada com a qualidade da água, independentemente de onde estiver”, disse Guillomaitre.
Embora os pesquisadores tenham notado que ainda estão trabalhando para criar protótipos para demonstrar que seu dispositivo pode ser dimensionado para uso doméstico, Priestley afirmou que, a curto prazo, acredita que o gel absorvedor solar poderia ser usado em situações de emergência, para fornecer acesso sob demanda a água limpa.
Com o apoio da National Science Foundation, a pesquisa levou ao lançamento de uma startup, a AquaPao, cofundada por Priestley, que continuará iterando e melhorando o design do gel absorvedor solar, testando sua durabilidade a longo prazo e identificando oportunidades para ampliar a tecnologia.
“Este trabalho é um exemplo maravilhoso de como a pesquisa acadêmica pode ser traduzida para o mundo das startups”, disse Priestley. “Através do nosso trabalho, conseguimos mostrar que a pesquisa pode ter um impacto significativo na sociedade.”
O artigo “Quick Release Anti-Fouling Hydrogels for Solar-Driven Water Purification” foi publicado na ACS Central Science em 8 de fevereiro. Além de Xu, Guillomaitre e Priestley, os autores incluem Kofi Christie, R. Kōnane Bay, Navid Bizmark, Sujit Datta e Z. Jason Ren, da Universidade de Princeton.
O trabalho foi apoiado pelos Centros de Ciência e Engenharia de Pesquisa de Materiais da National Science Foundation, pelo Fundo de Tecnologia Transformativa Eric e Wendy Schmidt da Universidade de Princeton, pelo Fundo do Projeto X e pela Princeton Catalysis Initiative.
Assista ao vídeo do dispositivo de purificação de água que usa a luz solar, com Rodney Priestley e Xiaohui Xu:
Autor: Colton Poore, Andlinger Center for Energy and the Environment
Fonte: Princeton University
Adaptado por Digital Water
